Previsão: poesia instável
Cirrus no céu: linha fina, elegante,
como verso de moça que sonha distante.
Altostratus pesa, grisáceo e sisudo,
um burocrata do tempo, calado de tudo.
Altocumulus — bolhas num mar de algodão,
coçaram a pele do velho Platão.
Nimbostratus, com cara de quem quer chover,
é nuvem com crise, sem saber o que ser.
Stratocumulus, vai, empurra, remenda,
parece reunião de pauta que não se entenda.
Cumulus? Ingênuo. Tão branco, tão bobo.
É nuvem criança correndo no lombo.
E o Cumulonimbus? Ameaça que encanta:
tem raio, trovão e uma alma flamenca.
Mammatus, bolsinha pendente, tão bela,
nuvem com seios — diria a Donatella.
Lenticularis paira feito nave mãe:
ETs em visita, mas ninguém vem.
Noctilucent! Ah, tu brilha no pólo —
poema noturno, vestido de solo.
E então os Contrails, suando os motores,
riscando o azul com sabores de dores.
São nuvens ou rastros? Pergunta maldita.
“É complô!”, grita o tio. A tia acredita.
Diz o poeta: “é vapor, é metáfora…”
Mas rima com medo, censura e discórdia.
Nas nuvens há de tudo: ciência, delírio.
E às vezes um gozo de céu tão etéreo.
No fim, toda nuvem é só tentativa
de desenhar o que passa — e ainda duvida.
Porque entre um nome e outro que o clima enfileira,
há sempre uma nuvem que falta na esteira.
E como diria Leminski, em leve desdém:
“nuvem é nuvem, mas sempre vem.”