Nucleus Essentiae
No centro da fruta, um caroço severo,
no centro do mundo, um pânico sincero.
Chamam de núcleo — palavra elegante
pra esconder a bomba no peito do amante.
Núcleo familiar? Um lar ou estopim.
Ninguém sabe ao certo onde acaba ou começa o fim.
Na célula, dança de DNA e mitose,
que às vezes vira câncer — uma apoteose.
Núcleo urbano: buzina e concreto.
No fundo, um sertão cercado de afeto.
Núcleo duro, núcleo gestor,
núcleo do medo, do ódio, do amor.
E o núcleo atômico, tão disciplinado,
segura a catástrofe com sorriso fechado.
Mas aí vem Chernobyl, vem Fukushima,
o núcleo vaza — e tudo contamina.
Veio Hiroshima, Nagasaki também,
só pra lembrar que o homem faz bem
em brincar de deus (fou-deus!) com seu dedinho torto,
plantando no chão o brilho do morto.
No núcleo da ideia há sempre uma falha,
um ruído, um eco, uma navalha.
E o essencial, dizem, é invisível ao olho,
mas fede a silício, a urânio, a orgulho.
No fim, talvez a essência nem tenha miolo,
apenas casca, verniz e consolo.
E o núcleo da essência, se é que há,
é só esse susto que insiste em ficar.