Carnudinha rosada
Te retirei, amor, da geladeira,
a carne em repouso, quase inteira,
seus sucos dormiam em nostalgia,
mas eu sabia — era o dia.
Fica ali, nua e rosada,
filé mignon de carne encantada,
1 quilo e um pouco mais de tentação,
deitada sobre a minha paixão.
Misturei, sem pressa, o feitiço:
2 colheres de azeite maciço,
2 dentes de alho bem amassados,
e mostarda Dijon — beijos passados.
Tomilho fresco, 1 colher sutil,
alecrim picado, do jardim febril,
saltei o sal com dedo profano,
e pimenta moída com gesto insano.
Te esfreguei — sim, sem pudor —
com as mãos cheias de sabor,
na carne espalhei minha intenção,
com tomilho e mostarda em combustão.
Na frigideira o calor se deu,
com azeite e desejo, o fogo cresceu.
Te selei, carnudinha, com devoção,
2 a 3 minutos em cada posição.
Você gemia em crepitar sutil,
selada em fogo alto, amor febril.
Seus sucos trancados no meu querer,
rosada, quente, pronta a ceder.
Ao forno te levo, 200 graus no termômetro,
termóstato 6-7, entre a carne e o centro,
20 a 30 minutos de espera aflita —
meu coração cozinha, a alma grita.
Te kiss malpassada, leve e suada,
a 50 graus, sua carne encantada.
Te retirei enfim, do forno em brasas,
e embrulhei seu corpo em papel de asas.
Descansou amor, 15 minutos no véu,
a carne, sossegada, voltou ao céu.
Te cortei então em medalhões de afeto,
1 cm de espessura, prazer discreto.
Te apertei — ah, carnudinha — sem dor,
macia estava, rosada em ardor.
Te servi com quentes batatas e vinho,
molho de roquefort, toque indecente.
Deglacei a frigideira do pecado,
com vinho tinto e um caldo ousado.
E ali, na mesa, foi oração,
carnudinha rosada, em adoração.
Seu gosto ficou na minha memória,
como um poema — quente — de nossa história.