A fábula mineira
(Gustavo de La Fontaine)
Em um quintal de película velha —
Preto, branco e toda a escala média —
As frangas viviam, de alma apagada,
Numa luz de projetor, tremida, gasta.
Entre elas, sombras de um cinema mudo,
Bicando o pó, o nada, o absurdo,
Com o peito cinzento, o olhar de celuloide,
Coladas ao chão como figurantes de umroid.
Eis que entra a raposa, um raio de azul vivo,
Rasgando o fotograma, tentando um desvio.
Com o pelo de um oceano na pele,
Com o passo de um prince, que ninguém repele.
Com um golpe preciso — quase um verso final —
Colheu a presa no próprio quintal.
As frangas, na falta de cor e de norte,
Foram ao banquete… e ele à sorte.
Assim a fábula revela, pelo cinza e pelo tom,
A voracidade que mora no próprio som —
De um mundo a preto e branco, de alma presa,
Onde o azul é parte, sem choque, sem surpresa.